Dia 02 de setembro foi a primeira aula da
interdisciplina “Infâncias de 0 a 10 anos” a professora Fabiana, começou a aula
fazendo vários questionamentos sobre infância ou infâncias? Teríamos que nos apresentar
e depois responder sobre alguma experiência sobre infância. Infelizmente não
consegui participar, mas vou deixar registrado.
Meu nome é Andreia, quando pensei sobre experiência com infância, lembro que desde pequena gostava de ter crianças por perto, e sempre que podia arrastava meia dúzia para dentro do pátio da minha casa. Quando ia no emprego da minha avó ajudava ela para depois brincar com os filhos da patroa dela e ajudava eles com as lições da escola. Minha infância foi
muito boa, foram meus avós maternos que me criaram
como se fosse filha deles, brinquei muito, minha imaginação voava, fiz muitas
artes também. Subia em árvores, comia frutas direto do pé estando ou não
maduras, adorava descer a lomba com carrinho de rolimã, sempre que minha avó não estive em casa, pois brincar com meninos nem pensar, tinha que ser tudo separado. Tomei água de poço e o mais engraçado que no verão era bem gelada
parecia que saia direto da geladeira, adorava quando meu avô chegava de viagem, sempre trazia alguma coisa diferente para nós, mas ficava profundamente triste quando tinha festas de fim de ano e ele estava muito longe e não podia estar conosco. A luz elétrica lembro que demorou para ter na vila onde morava, acho que tinha uns
nove anos quando passaram com os postes e começaram a instalar nas casas, então televisão era coisa de gente rica, mas com economias minha avó comprou uma que era preto e
branco e via todos os dias o Sítio do Pica Pau Amarelo quando chegava da escola, mas era só o que podia olhar, pois era criança, mesmo assim não gostava de ver outros programas, a não ser reportagem de bichos,
Tinha muita vontade de ter muitos irmãos, então sempre que podia levava
todas as crianças da rua brincar comigo, e logo minha mãe
casou de novo e ganhou minha maninha,
que eu pedia para minha avó ficar com ela lá em casa. Fiquei mais
feliz quando a tia deixou meu primo conosco para poder trabalhar, então
meus sonhos começavam a se realizar, a casa estava ficando cheia de crianças.
De todas as crianças eu era a mais velha, e filha mais velha, neta mais velha,
por isso comandava as brincadeiras e sempre me senti responsável pelos menores,
e adorava quando a casa estava cheia de crianças. Fazia casa de árvore, casas
de resto de madeira e lona, casas de tijolos onde separava tudo direitinho, com
móveis de tijolos também, usava tudo da obra da casa que estavam construindo,
fazia balanços, brinquedos de todo que tipo, até um carrinho para descer a lomba, mas quem desceu foi meu primo e se quebrou todo, eu tomei uma surra para deixar de inventar brincadeiras que poderiam machucar os pequenos, brincar de fazer comida em latas de
óleo e de condimentos, usava vela para fonte de energia, um dia fiz até um bolo e o pior de tudo é que a gente comia tudo de verdade. Claro o arroz demorava
muito tempo para cozinhar e as verduras pegava da horta da minha avó, sucos de
laranja ou limão já que tínhamos plantações de todo tipo e sempre achava um
mesmo verde para nossas brincadeiras. Em épocas de plantio, ajudava a plantar
de tudo, nunca tivemos que comprar legumes e verduras, tudo era plantado no
quintal. Não tinha bonecas então pegava qualquer coisa para fazer de conta que
era uma filha, uma boneca, quilos de feijão e arroz e as vezes vestia com as roupas do meu primo que era
roupas de bebê. Sem falar nos milhos que tinha aquele cabelinho amarelo onde tirava do pé muito verde só para brincar, depois comia ele verde mesmo era bem docinho, mas quando minha avó descobria era uma briga.
Um
diferencial meu das outras crianças é que sempre minha avó me criou com muita
autonomia e tinha uma certa responsabilidade, com menos de sete anos ia até a farmácia buscar medicamentos, compras
no mercado, buscar taxi quando ela precisava, nem sabia ler e escrever já era
uma mandona e fazia tudo muito rápido, tudo para ajudar aquela pessoa
maravilhosa que salvou minha vida. Lembro de uma vez que tive que ir levar o
dinheiro e os documentos do meu avô no canteiro de obras que naquele dia ele
iria viajar para o Rio de Janeiro. Para surpresa dele estava sozinha e ele
ficou admirado por eu saber sair de Viamão e ir até centro de Porto Alegre
pegando ônibus sozinha, essa foi a primeira vez, em um outro dia me perdi da
minha avó com meu primo, e fui atrás dela em todos os lugares possíveis que ela
poderia estar, então me achando sozinha com meu primo que na época só tinha
três anos e eu sete, fui ao fim da linha do ônibus, expliquei para o fiscal a
situação e ele deixou nós ir para casa, aquele dia quase matei a coitada da vó,
ela pensava que uns ciganos tinham nos raptado. Desci e como minha mãe tinha a
casa dela perto da casa da minha avó fomos para lá, e disse o que havia
acontecido, ela riu muito e nos deu almoço. Minha vó chegou e nem sabia o que
dizer para ela, pois em seu entendimento a gente teria desaparecido da pracinha
onde ela nos deixou. Tadinha hoje que sou mãe sei o sofrimento que ela passou e
a agonia de ter pensado que tinha nos perdido Sozinha em termos, como fui
criada com um pensamento que temos sempre a companhia do anjo da guarda e que
Deus está sempre junto de nós, não me sentia sozinha, sentia que nada podia
acontecer comigo, claro nunca falava com estranhos e muito menos aceitava doces
ou algo do tipo.
Não lembro se naquele tempo já existia
tantas maldades, ou não eram anunciadas para todos, mas me sentia livre, não
tinha medo de sair no meio da noite se precisasse, todas as pessoas da vila me
conheciam e também conhecia elas. As portas das casas não eram fechadas,
ninguém invadia os pátios, batiam e pediam se precisassem de alguma coisa,
todos se respeitavam e se ajudavam.
Hoje não consigo ficar em casa sem passar
a chave na fechadura, mesmo estando com os filhos ou marido dentro de casa, me
chamam de neurótica. Não criei meus filhos como fui criada, sempre levei e
busquei eles na escola até o sexto ano, e nunca deixei eles pegar um ônibus sozinhos até os treze anos, onde iam ate a casa da avó deles, minha mãe. Trabalhava e ligava muitas vezes por
dia para ver se estavam bem. Eles já nasceram com uma televisão na casa
colorida, e percebia que até para dormir o som da TV era bom e eles dormiam
mais tempo com aquele barulho.
Hoje está tudo mudado, as pessoas não se
conhecem e muito menos se cumprimentam, ninguém ajuda seu próximo sem querer
algo em troca. E assim vamos criando filhos que estão sempre na ofensiva, com
medo do outro, e com medo de viver. Criamos hoje crianças dependentes, e
futuros adultos dependentes, por causa de tanta violência que nos circunda. Se
hoje perguntassem se queria ter outro filho, responderia que não sou louca de
colocar outro filho nesse mundo tão cruel como hoje se encontra, acho que esse
sentimento é um misto de insegurança e medo do futuro, espero que isso mude, e
acabe termine toda essas violências que existem, que as pessoas voltem a
acreditar numa sociedade que tenha uma política igualitária e com direitos para
todos cidadãos, que a paz volte a reinar, e que as pessoas voltem a
compartilhar momentos que foram esquecidos em um passado não muito distante da
atualidade.
Olá Andreia,
ResponderExcluirImportante os fatos relatados em seu Portfólio de Aprendizagem e de como você fez as suas conexões do passado com o presente e de como eles foram marcantes em sua trajetória tanto na vida pessoal como profissional.Parabéns!